Uma descoberta rara foi feita pela pesquisadora Leah Veronese, da Universidade de Oxford, na Inglaterra: uma cópia manuscrita do Soneto 116 de William Shakespeare, com adaptações significativas.
O documento estava entre os papéis de Elias Ashmole, monarquista do século 17 e fundador do Museu Ashmolean. Relatado em um artigo publicado na revista Review of English Studies, o achado traz uma nova perspectiva sobre como o poema foi interpretado e reutilizado ao longo da história.
Veronese encontrou o manuscrito na Biblioteca Bodleian enquanto trabalhava em sua pesquisa de doutorado. O texto fazia parte de uma miscelânea, um tipo de coletânea que reúne diferentes obras literárias. Essas coleções eram comuns na época e muitas vezes refletiam debates políticos e religiosos do período.
O que chamou a atenção da pesquisadora foi que o soneto apresentava uma linha extra no início e não mencionava Shakespeare no catálogo da biblioteca. Esse detalhe pode ter feito com que o poema passasse despercebido por séculos. O catálogo descrevia o texto apenas como um poema “sobre constância no amor”, sem identificar sua origem.
Outro aspecto surpreendente é que essa versão do soneto foi adaptada como canção pelo compositor Henry Lawes. Embora o manuscrito encontrado traga apenas o texto, a partitura da música pode ser consultada em um livro de canções preservado na Biblioteca Pública de Nova York. Para adaptar o soneto à música, foram adicionadas sete linhas e alterados trechos do início e do final.
No texto original de Shakespeare, os versos iniciais dizem:
“Que eu não admita impedimentos para o casamento de mentes
verdadeiras; amor não é amor
Que se altera quando a alteração encontra”
Já na versão descoberta por Veronese, o poema começa de maneira diferente:
“O erro auto-cegante se apodera de todas aquelas mentes
Que com falsas denominações chamam aquele amor
Que se altera quando as alterações encontram”

Versos de Shakespeare têm significados que vão além do amor romântico
As mudanças podem ter sido feitas para ajustar a métrica da música, mas também permitem uma possível interpretação política e religiosa. Durante a Guerra Civil Inglesa, muitos artistas e escritores usavam metáforas para expressar opiniões sobre os conflitos entre monarquistas e republicanos.
O manuscrito encontrado estava entre outros textos carregados de significados políticos, como canções natalinas proibidas e poemas satíricos sobre a crise da década de 1640. No contexto monarquista de Ashmole, as mudanças no soneto podem ter transformado o poema em um apelo à lealdade ao rei e à constância na fé.
Segundo a professora Emma Smith, especialista em Shakespeare na Universidade de Oxford, o Soneto 116 é hoje um dos mais famosos do autor, mas não era amplamente conhecido na época. Essa nova versão mostra que os versos do escritor foram reinterpretados e politizados, ganhando significados que vão além do amor romântico.
Via:Olhar Digital